MATA E SÃO PEDRO DO SUL:
O Caminho da Floresta Fóssil
As cidades de Mata e São Pedro do Sul fazem parte do Sitio Paleobotanico do Arenito Mata, onde se encontram os troncos fosseis e também alguns fosseis repteis mais importantes do Estado do Rio Grande do Sul.
Figura 1. Praça do Santo Brugalli decorada a partir de troncos Fossilizados.- Mata/RS
Fonte: GeoRoteiros.
Figura 2. A - Igreja em Mata (base feita em troncos fósseis); B - Escada na Praça Santo Brugalli; C - Parte do calçamento da cidade D - Escadaria que leva à gruta Nossa Sra.de Lourdes. Fonte: GeoRoteiros.
Mata é considerada a cidade do Museu a céu aberto, onde os troncos fossilizados podem ser encontrados em varios cartões postais da cidade como a Gruta Nossa Senhora de Lourdes e a Igreja Matriz, todas ornamentadas com troncos fósseis (Figura 2A, 2C e 2D).
A cidade também possui o Museu Pe. Daniel Cargnin, que conta com um acervo de 2.500 exemplares de fósseis da região e do Brasil, minerais, peças arqueológicas e objetos de caráter histórico que contam um pouco da cidade e da cultura alemã que colonizou a região. Por fim, não podemos deixar de destacar o Jardim Paleobotânico de Mata (Figura 3), que possui troncos fósseis na posição e local onde foram depositados, sendo a única reserva delimitada do Brasil em quantidade de fósseis do gênero.
São Pedro do Sul, município vizinho à Mata, também possui os mesmos troncos fósseis, além de fósseis de um réptil conhecido como dicinodonte, representativo dos grupos de répteis triássicos que estiveram ligados à origem dos mamíferos (répteis mamaliamorfos). Outros exemplares de
dicinodontes encontrados na região podem ser vistos no Museu Paleontológico Arqueológico Walter Ilha, na cidade de São Pedro do Sul, e que também apresenta troncos fósseis.
Contexto Geológico das Áreas
Como visto acima, as cidades de Mata e São Pedro do Sul estão sobre uma extensa região rica em fósseis, constituída de importante flora e fauna fóssil já extinta. Mas para podermos estudar como se formaram os conjuntos de rochas sedimentares do período triássico (intervalo que compreende de 251 a 200 milhões de anos atrás) do RS, precisamos entender a história de formação de uma bacia sedimentar (grande depressão no terreno que acumula, com o passar do tempo geológico, diferentes tipos de materiais em seu interior). As rochas que existem na região estão inseridas na chamada Bacia do Paraná.
Conforme se pode observar pela Figura 4, o mundo estava unido em grandes extensões de terra, estando a América do Sul e África, juntas. Nessa época, a Bacia do Paraná não possuía ligação nem incursões marinhas, possuindo caráter continental.
Figura 3. Imagens do jardim Paleobotânico de Mata, troncos em posição em que foram depositados. Fonte: GeoRoteiros.
Os sedimentos nela depositados e que, posteriormente viriam a se tornar rochas, mostram que aí se desenvolviam grandes sistemas fluviais, ativados periodicamente e que, com sua força, derrubava e transportava imensos troncos de coníferas. Os animais e plantas que lá viviam, após sua morte, deixaram o seu registro nessas rochas, possibilitando que hoje tenhamos conhecimento de sua existência e seus hábitos.
Figura 4. Posicionamento dos continentes durante o período Triássico Superior. O Circulo preto indica a posição aproximada do estado do RS. Fonte: Modificado de www. Cpgeosystems.com
O arenito, que é a rocha predominante nos locais de ocorrência dos troncos fósseis (Figura 5A e 5C), é formado por grãos de areia compactados naturalmente pelo ambiente durante milhões de anos. Ao se observar atentamente as rochas é possível diferenciá-las entre arenitos e conglomerados (rocha com partículas arredondadas com dimensões maiores que 2 mm misturadas com material mais fino) (Figura 5B), assim como notar suas estratificações cruzadas (estruturas internas presentes nas mesmas (Figura 6), onde o sedimento quando depositado deixou pequenas marcas que ficaram registradas quando este se tornou rocha). Essas características podem indicar o ambiente onde esses sedimentos se depositaram, no caso desses arenitos e conglomerados, o leito de um rio.
Para que fossem preservados, os troncos tiveram os espaços entre suas células, e no interior delas, preenchidos por sílica (SiO2) ao longo de milhões de anos, ocasionando a preservação dos mesmos na forma como são encontrados. Os troncos são de coníferas (Coniferophyta), grupo que hoje inclui os pinheiros. O estudo dos lenhos fósseis mostrou que as coníferas e os restos fosseis encontrados pertencem à mesma família de pinheiros que ainda hoje cresce no Rio Grande do Sul, a das araucárias.
Figura 5. A - Parte de Tronco fóssil; B - conglomerados no local de ocorrência dos troncos; C - tronco encontrado nas rochas próximo a São Pedro do Sul. Fonte: GeoRoteiros.
Os Fósseis e o Antigo Ambiente
Então, somando o tipo de sedimento, com as estruturas preservadas, é possível interpretar que durante o final do triássico na região, existiam sistemas fluviais entrelaçados (de grande energia), que se formaram sob a vigência de um clima seco a sazonalmente úmido. Esse rio possuía canais rasos, todos interconectados e possuindo barras (ilhas de acúmulo de rochas e areias trazidos pelo rio em épocas de cheia e depositados em épocas de seca). Um evento catastrófico de grandes proporções (alguma cheia repentina no rio) teria carregado esses troncos até o seu local de deposição, posteriormente preservando-os (Figura 7).
Figura 6. Estruturas (estratificações) cruzadas no arenito. Fonte: GeoRoteiros.
Figura 7. Representação de um rio Entrelaçado: Ambiente de formação para os troncos fósseis. Fonte:Georoteiros
Preservação e Patrimônio Fossilífero
Quando se fala em preservar não se pode esquecer de mencionar os nomes de duas pessoas: Padre Daniel Cargnin e Walter Ilha. Ambos lutaram, ainda na década de 60, pela divulgação científica e preservação do patrimônio fossilífero em Mata e São Pedro do Sul, respectivamente, criando museus e praças com o material existente na região.
Os afloramentos de ocorrência dos troncos encontram-se em estado de abandono, sem nenhuma medida de proteção ou mesmo sinalizações indicando a importância dos locais. Ainda que existam leis estaduais para a preservação dos mesmos, nada de realmente efetivo vem sendo feito na preservação desse patrimônio natural de valor científico inestimável.
Localização:
Leitura Recomendada
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SCHULTZ, C.L. 1995. Os répteis fósseis da região de Santa Maria. Ciência Ambiente, nº 10
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SCHULTZ, C.L; SOUZA, P.A.; IANNUZZI, R. 2004. Antes dos Dinossauros – A Evolução da Vida e o seu Registro Fóssil no Rio Grande do Sul, UFRGS. p. 71– 89
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SCHULTZ, C. L.; LANGER, M. C. 2007. Tetrápodes Triássicos do Rio Grande do Sul, Brasil. In: Ismar de Souza Carvalho; Rita de Cássia Tardin Cassab; Cibele Schwanke; Marcelo de Araujo Carvalho; Antonio Carlos Sequeira Fernandes; Maria Antonieta da Conceição Rodrigues; Marise Sardenberg Salgado de Carvalho; Mitsuru Arai; Maria Emilia Queiroz Oliveir. (Org.). Paleontologia: Cenários de Vida. 1 ed. Rio de Janeiro: Interciência, v. 1:277-290
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SOMMER, M.G.; SCHERER, C.M.S. 2000. Sítios Paleobotânicos do Arenito Mata (Mata e São Pedro do Sul), RS. Uma das mais importantes “florestas petrificadas” do planeta. Sítios geológicos e paleontológicos do Brasil – SIGEP, 09.
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ZERFASS H.; LAVINA E.L.; SCHULTZ C.L.; GARCIA, A.J.V.; FACCINI, U.F.; CHEMALE JR., F. 2003. Sequence stratigraphy of continental Triassic strata of Southernmost Brazil: a contribution to Southwestern Gondwana palaeogeography and palaeoclimate. Sedimentary Geology, 161: 85–105.